Imagine.
Há um grupo de pessoas vivendo da caça, mudando de casa toda vez que os animais mudam. A manada anda, as pessoas andam atrás.
Dentro do grupo, há um grupo menor, que fica encarregado das lanças. Eles lascam a pedra, amarram-na em pedaços de madeira e testam para ver se funciona. A lança é fundamental para a sobrevivência de todos. Sem elas, não há caça. Sem caça, não há comida.
Dentro do grupo menor, há um solitário. Ele faz lanças, mas prefere fazê-las sozinho. Gosta de pensar nas lanças antes de fazê-las. Um dia, por um acaso, tem uma ideia: uma lança menor, e uma maneira de atirá-la de longe. Mais eficiente, mais seguro. Bom para caçar animais grandes, bom para caçar animais pequenos.
Imagine.
Em sua cabeça solitária, ele pensa que todos vão gostar. Melhorará a vida. Em sua ignorância, vai ao grupo anunciar sua invenção.
É recebido com escárnio.
Raivoso, isola-se e dedica-se ao trabalho. Cria o arco e flecha. Retorna ao grupo e o demonstra. Funciona.
O escárnio se transforma em ataque. Os demais encarregados da lança juram que não funcionará contra os animais. Os outros ficam inseguros. Não entendem. Decide-se que o arco e a flecha serão quebrados, e nunca mais se falará deles. Mas o lanceiro solitário não é mais capaz de gastar seus dias criando uma arma inferior. Ele sabe demais.
O que ele não sabe é que o trabalho de fazer lanças não tem nada a ver com a caça, e sim com o grupo. Num lugar longe dali, as pessoas colhem a comida com as próprias mãos.
Imagine.