Eu caminho de cabeça baixa pela calçada, perdido em mim mesmo, até que alguém venha na direção contrária.
Esta pessoa é uma história. Sem a história, não passa de uma série de reações químicas. Ela se aproxima, eu imagino qual seja sua história. É apenas uma inferência. Dou-lhe um estereótipo, um papel de coadjuvante na minha própria história. Tenho certeza de que ela faz o mesmo, se estiver interessada o suficiente, ou se for vulnerável o bastante para ter sua invisibilidade afetada por um estranho qualquer que caminha pela calçada.
A única forma de estarmos todos juntos numa cidade tão grande quanto esta é o profissionalismo. Há uma barreira entre o que serve e o servido, uma precaução contra a intimidade. Um de nós é o Cliente, o outro é o Profissional. Tento contar a história do Profissional enquanto passo as compras e a história do Cliente enquanto passo o orçamento. Ambos pensamos em voltar para casa.
Há uma força contrária, de imersão, que aparece cada vez que eu me encontro com um desses personagens. Um amor há muito tempo perdido, uma memória de infância, quando todas as pessoas eram honestas, inocência que nunca mais volta, que não é deste mundo, mas da história que conto sobre as pessoas em minha própria cabeça.
Faço-me de invisível para que meu coração não se parta.